quarta-feira, 7 de abril de 2010

Desconstruções & Paradigmas

Os dicionários e wikipédias da vida, em resumo, definem educação como o processo de ensinar e aprender. Percebo que em quase todas as sociedades, países, culturas, etc., esta tem sido a definição básica para o que chamamos educação.
Por 18 anos participei, ativamente, de umas das vertentes deste processo com publicações de livros para crianças. Porem, minha experiência transcende o profissional, como mãe de três filhos.
Curioso que, os mais sábios que por aqui passaram, entre eles Sócrates e Platão, não compactuaram com este “processo” e tampouco o utilizaram ou mesmo o recomendaram.
Ou seja, de acordo com a “muderna” maneira de educar, é pressuposto que alguém (o que ensina) saiba mais do que aquele que aprende.
Então, a educação torna-se um processo vertical que geralmente é de “cima” para “baixo”.
É mais ou menos como um passar de informação. Alguém informa outro alguém de alguma coisa.
Mas, isto tudo, recheado de inúmeras teorias, de imensas complexidades.
Alguns são até muito bons na teoria, mas a pratica torna-se um desastre. Usam-se termos incríveis para definir o óbvio ou para complicar o simples. São palavras que por si só brilham para obscurecer o conteúdo simplório e equivocado.
Em detrimento de alguns teóricos, como Rogers, colocarem as questões de forma mais profunda caem, contudo, num vazio horripilante. Ele (Rogers) pressupõe que o professor dirija o estudante às suas próprias experiências, para que, a partir delas, o aluno se autodirija.
Ora, ai está! Há milênios Sócrates fazia exatamente isto!
E o que vejo como resultado, é que, incluso as mães (eu estou nesse meio) fazem do processo educativo o absoluto inverso daquilo que seria...direi...mais democrático ou menos tirano.
Uops...tirano?
Ué, tirania tem a ver com isso tudo, gente!
Então, os pais procuram enfiar goela abaixo de seus filhos o que aprenderam, como percebem o mundo e as coisas todas que fazem parte da sua própria vida, repetindo com os seus filhos, exatamente, aquilo que seus pais fizeram com eles.
Ahhh sim, com uma mudançazinha aqui e outro confeitinho ali, mas enfiando goela abaixo dos filhos as teorias e comportamentos que supõem adequados tal qual eles vivem, vêm e acreditam.
Esquecem-se que o outro é um ser diferente, singular e com direito à soberania em suas vidas.
Urgindo sempre que os filhos utilizem suas (dos pais) experiências de vida, como se o processo de aprendizagem e vivência pudesse ser assim transferido, absorvido e aceito pelos filhos como uma verdade e ponto final!
Alem disso, usam o processo educativo como um meio de passar apenas a informação. Mais ou menos assim: “eu falo e você ouve”; “eu digo e você tome como verdade”; “eu mostro e você vê”, “caso contrário você é um rebelde, é um desmiolado”.
Está mais que na hora de se desconstruir esta tirania disfarçada em educação, sempre com o molho da frase gasta: “Eu tenho uma experiência e se faço isto é porque eu me preocupo com você, é por amor”.
Uopsss amor! Claro que nós, mães e pais, amamos nossos filhos! Nem por um momento coloco isso em causa. Tampouco para mim mesma. Pois acreditem, eu estou no mesmo barco! Mas somos tão condicionados, gente!
Ou por outro lado, existem aqueles pais e mães que simplesmente são permissivos, pois é mais cômodo, e criam uma realidade caótica e desrespeitosa, invasiva e egocêntrica para si e seus filhos. Os “deseducadinhos”, os que tudo podem e tudo querem, saem pelo mundo achando-se donos dele.
Então assim construímos as realidades que nos cercam!
A gente bem que tenta ser mais liberal, mais aberta, mais tudo mas, desde que nossos filhos façam e percebam o que dizemos e mostramos.
E muitas vezes, os impedimos de construírem sua própria trajetória e de viverem seu próprio descobrir.
Cada mãe ou pai deseja e trabalha para que seus filhos sejam felizes, realizados, amados. E, para tal, com arrogância, procura limpar os caminhos deles com as habilidades aprendidas ao longo de sua vida pessoal, mas não da vida deles. E assim não percebe que, a pedra que tirou do caminho deles, podia servir para que eles aprendessem mais tarde a ver as pedras e a evitá-las, ou retirarem-nas ou mesmo tropeçar nelas e ver que o joelho machucado pode ser um excelente professor.
A desconstrução destes condicionamentos educativos é dolorosa.
Aff! Eu que o diga!
A primeira coisa a fazer, é perceber que aquilo que, em nossos filhos, mais nos incomoda, mais nos irrita a ponto de gritar ou desesperar-se, é porque estamos vendo o que criamos!
Ahhh sim, somos os criadores desta realidade e, então, há que assumir a responsabilidade de tal criação!
E ao fazê-lo, nos deparamos com nós mesmas, nos olhamos, mas devemos nos olhar no sentido de querer ver, de querer de fato perceber o que, e como, criamos esta realidade que nossos filhos nos espelham!
E o que vemos? Nada agradável, um lado obscuro, feio, distorcido de si mesma.
Hummm! É preciso coragem!
E é preciso, pouco a pouco, ir se absolvendo de tal feito! De tal aspecto, com compaixão por si mesma, com acolhimento, com respeito e com amor próprio!
E, então, algo novo surge! Uma compreensão, uma vivência de si mesma. Uma auto percepção de que, assim como nossos filhos, nós somos muito mais do que imaginamos ser, muito mais vastas, acima dos condicionamentos, dos sistemas, dos limites, das crenças e livres, soberanas. Cada uma de nós é um ser único e singular, tal qual cada um de nossos filhos.
Nem por um segundo duvidem de que falo de mim mesma!
Mas, também falo de muitos pais e mães que vivem o equívoco de que educação é informação, regras e transferências de vivências.
Nós, pais e mães somos aqueles que, tão somente, possibilitamos estes seres incríveis e vastos de estarem neste mundo caminhando por suas próprias pernas.
Somos responsáveis por eles no processo educativo, enquanto são crianças, porem que o façamos, sempre, tendo claro que eles são indivíduos a parte de nós, de nossas crenças, de nossas vivências.
O caminho de uma mãe ou de um pai e seus filhos, é como o fio da navalha! E neste, só o amor incondicional é o calçado que impede o corte.
Quem me despertou para todo este auto conhecimento? Para esta incrível viagem? Uma menina de 24 anos que adentrou minha casa, com muito amor e muito respeito por mim, a me dizer coisas que só alguém com grande vastidão de vida pode falar. Só alguém que tendo percorrido dentro de si a grande viagem de volta a si mesma, só alguém com tal sabedoria pode falar.
Portanto, uma jovem de 24 anos a educar uma senhora de 63 anos!
Paradoxal não? Mas puxa! Que grande aventura paradoxal é a vida que criamos para nós mesmas!
Gratidão!

Um comentário:

Duca disse...

Meu amor,

Nos últimos tempos muito se tem falado aqui em Portugal de educação, especialmente a propósito do bullying nas escolas entre os mais jovens e da violência exercida em professores.
Tenho lido muitos textos de especialistas mas, sinceramente, nenhum como este.
Neste texto tratas do que considero o cerne de algo a que muitas pessoas ainda não acessaram e que lhe chamarei de "educação pró-activa" em que aquele que educa é também educado e, vice-versa. Estou certa que, se esta forma de educar fosse apreendida por todos os progenitores, os ajudaria muito e aos nossos jovens.
De facto, se por um lado há progenitores que se divorciam completamente da sua responsabilidade na educação dos filhos atirando-a para os outros, por outro lado, há os que se tornam tiranos, exigindo que os filhos façam ou sejam aquilo que eles querem, sem o mínimo de respeito pela individualidade deles (filhos).
É preciso ser-se muito consciente e sábio para se ter a humildade de aceitar aprender, aos 63 anos, com uma jovem de 24!
Maravilhoso este post, meu bem. Sinto um orgulho enorme de ti.